Capítulo 37
Harumi mantinha
o pescoço bem coberto pelo cachecol enquanto caminhava ao lado das amigas até o
portão da escola. Estava muito frio e a mochila pesava em suas costas. Depois
de uma breve busca, percebeu que a mãe não a esperava e, desanimada,
encostou-se ao portão. Assim que viu o familiar carro prateado de vidros muito
escuros estacionado num local próximo correu até ele. A porta foi aberta pelo
lado de dentro e Harumi logo largou-se no banco de trás.
– Tio Jun! – exclamou, esticando-se
para abraçar Jun.
– Você está gelada, meu anjo. –
ele apertou as bochechas dela, aumentando o aquecedor do carro.
– O que está fazendo aqui? –
tirou o cachecol e aninhou-se nos bancos de couro.
– Sua okaasan pediu para eu vir buscá-la, então terminei as gravações e
vim. – ligou o carro.
– Hum, está tudo bem?
– Hai, só frio, né? Acho que vai nevar hoje.
– A okaasan está trabalhando mais do que deveria, ultimamente. – Harumi
constatou, preocupada com a mãe.
– Verdade, né? – Jun concordou –
E então, o que vamos fazer até sua okaasan
sair do trabalho?
– Podemos ir pra um lugar
quente? – os lábios de Harumi ainda estavam levemente arroxeados.
– Para onde quiser. É você que
está no comando. – ele dirigia calmamente, sem destino certo.
– Certo, então quero ir para o
seu apartamento e depois podemos pedir uma pizza. O que acha? – sorriu amarelo.
Harumi adorava o apartamento de Jun.
– Como eu disse, você é quem
manda. – fez o retorno, visivelmente feliz por poder ir pra casa depois de um
dia cansativo de trabalho.
Harumi achava o apartamento de
Jun um lugar mágico, especialmente a vista da janela do quarto dele. Deixou a
mochila sobre o sofá e correu para lá, quase encostando o nariz ao vidro. O sol
estava se pondo, o céu colorido de rosa, amarelo e azul. As árvores de
cerejeira estavam totalmente sem folhas ou flores.
– Lindo né? – Jun aproximou-se –
Eu realmente deveria olhar por essa janela mais vezes.
– Deveria mesmo.
– O que acha de tomar um banho para
se aquecer de verdade? Há algumas roupas suas aqui em algum lugar. – ele
sorriu, lembrando-se do dia que pedira para Eloise deixar algumas mudas de
roupa da pequena em sua casa.
– Hum, estou indo. – deu uma
última olhada pela janela, então pegou a toalha que Jun lhe estendia e saiu do
quarto, indo em direção ao banheiro.
– Vou deixar a roupa sobre a
cama. – ele avisou, colocando carinhosamente as roupas dela em cima da cama do
quarto de hóspedes.
Harumi saiu do quarto vestindo
uma roupa quentinha e encontrou Jun na sala, com os cabelos molhados, enrolado
a um cobertor. Ele convidou-a para se sentar ao seu lado, sorrindo.
– Já pedi a pizza. – Jun disse.
Ele sempre se sentia tão bem ao lado de Harumi.
– A de sempre? – ela inquiriu.
– Certamente.
– Né, a okaasan deve estar com frio. – enrolou-se mais ao cobertor.
– Logo, logo ela chega. – ele
trocou de canal.
– Hum, tio Jun, posso fazer uma
pergunta? – ela sentiu sua face queimar.
– Todas que quiser.
– Será que um dia vou poder te
chamar de otousan? – sentiu também,
os olhos marejando e virou-se para a televisão.
Jun sentiu aquelas palavras
atingirem-no com uma força inimaginável e permaneceu alguns segundos sem reação
alguma. Ele sempre a viu como uma filha, ou algo do gênero. Certamente ele a
amava, assim como amava sua mãe, e queria mais que tudo poder chamá-la de
filha.
– Talvez um dia, né? – ele
sorriu, bagunçando o cabelo dela.
O interfone tocou estridente e
Jun levantou-se num salto. Saber que Harumi o queria como pai era a constatação
de que ele realmente deveria correr atrás de Eloise.
– Vou descer para buscar a
pizza. Logo volto. – ele puxou a porta atrás de si.
Harumi pegou o controle e mudou
o canal. Estava passando o dorama de
Jun com Aiba.
Alguns minutos depois, o elevador parou em frente à porta de Jun e ele
ouviu uma gargalhada alta vindo do interior do apartamento. Abriu a porta
silenciosamente e observou Harumi. Ela assistia ao seu dorama e estava rindo de Aiba.
– O que é que está tão
engraçado? – Jun perguntou, deixando a pizza sobre a mesa de centro.
– O Tio Masaki é terrível como
vilão! – ela ainda ria, os olhos fixos na TV.
– Deixe-o ouvir você dizendo
isso. – ele riu junto – A propósito, isso não é dorama pra meninas da sua idade – tomou o controle.
– Tio Jun! – Harumi reclamou
quando Jun desligou a TV.
– Depois que comermos eu ligo
novamente... só que não nesse canal. – ele abriu a caixa e o cheiro da pizza
encheu o ambiente.
– Parece gostoso. – ela esticou
a mão para pegar a pizza – Só falta a okaa...
A campainha tocou estridente,
interrompendo Harumi.
– Não falta mais! – Jun disse,
correndo até a porta.
Mesmo escondidos sob o cachecol,
os lábios de Eloise estavam roxos e a face vermelha, como se ela estivesse
envergonhada. Uma touca cobria seus cabelos e ela vestia um grande casaco
preto. Parecia muito cansada.
– Yo! – Eloise cumprimentou-os,
sorrindo.
– Entre. – Jun deixou que ela
passasse, e fechou a porta.
Enquanto ela tirava todos os
casacos e pendurava-os no armário ao lado da porta, Jun quase pode vê-la
descongelando.
– Desculpem a demora, tive que
cobrir uma pauta numa cidade vizinha e acabei me atrasando. – ela abraçou forte
a filha, afagando-lhe a cabeça.
– Tio Jun disse que vai nevar. –
Harumi sorriu.
– Odeio o frio, mas eu gosto
tanto da neve. – ela comentou, sentando-se ao lado da filha e puxando a ponta
do cobertor.
– Hum, vamos comer? Vai esfriar.
– Jun sentou-se em frente à pizza e escolheu um pedaço.
– Com a fome que estou, tudo o
que eu queria era uma pizza. – Eloise comentou, entregando um pedaço grande
para a filha e pegando um para si.
Logo a caixa de pizza estava
vazia, Jun e Eloise conversavam normalmente enquanto Harumi assistia a um anime
na TV. Certamente ela não se lembrava do que havia dito a ele há alguns dias
atrás. Harumi levantou-se silenciosamente e foi para o quarto de Jun, olhar
pela janela novamente, deixando os dois a sós.
Com a saída de Harumi, Jun
percebeu a deixa. Ele sentou-se ao lado de Eloise e sem hesitar, segurou sua
mão. Ainda estava gelada e ele pôde ver os pelos do braço dela se eriçando ao
seu toque.
– Ainda está com frio. – ele
falou, aproximando-se mais e lhe envolvendo num abraço.
– Jun, o que está fazendo? –
perguntou, sem entender o que estava acontecendo.
– Te aquecendo. – sorriu,
enterrando seu nariz nos cabelos dela.
– Está tudo bem, Jun, logo vou
ficar quentinha. – sorriu de volta.
– Elô, tem uma coisa que eu
queria te dizer.
– Sabe que pode dizer. – um
sorriso tranquilo estava estampado em sua face, mas ela sentiu seu coração
disparar levemente.
– Certo. – então ele
aproximou-se novamente e, sem que ela pudesse reagir, colou seus lábios aos
dela. Foi um beijo lento e ritmado, que ignorava as batidas rápidas e
inconstantes de ambos os corações.
– O que está fazendo? – Eloise
conseguiu dizer, entre os beijos, mas sem parar.
– Aquilo que eu queria dizer,
sou melhor em mostrar. – ele olhou-a nos olhos enquanto falava, então tornou a
beijá-la.
Em momento algum ela empurrou-o
ou recusou o beijo, estava respondendo melhor do que ele havia imaginado.
Depois de vários minutos, Jun se afastou alguns centímetros para que pudesse
olhar dentro dos olhos dela.
– Não vou me desculpar como da
primeira vez. – Jun sorriu, afagando a bochecha queimada de frio dela – Esperei
quase oito anos por isso.
– Jun, não... – ela começou.
– Escute. – ele disse, sério –
Há oito anos eu disse que te amava, e eu ainda a amo mais que tudo nesse mundo,
então por favor pare de ser teimosa.
– Eu... eu... – tentava pensar
em algo que não soasse infantil – Eu não posso.
– Você pode sim, nós podemos. Eu
sei que gosta de mim. – passou a mão em seu pescoço quente – Elô... Ise-chan,
eu te amo... Aishiteiru yo.
– Nunca duvidei disso, mas acho
que eu não vou corresponder do jeito certo. – Eloise tirou com cuidado a mão
dele de seu pescoço.
– Já está correspondendo, só
você não percebe. – apertou a mão dela – Haru me perguntou quando poderia me
chamar de otousan. Até ela percebeu.
Então, uma única lágrima
escorreu pela face dela e ele secou carinhosamente. Ela, enfim, aproximou-se
dele e enterrou sua cabeça no peito de Jun.
– Hontou ni gomenasai... me desculpe por fazê-lo esperar tanto tempo.
– ela disse, erguendo o rosto e depositando um beijinho em seu queixo.
– Eu nunca me cansaria de
esperar. – segurou o rosto dela contra o seu, nariz com nariz.
– Aishiteiru yo. – ela sussurrou, olhando no fundo dos olhos dele.
Eloise encostou-se em Jun,
deixando que ele a envolvesse com seu calor e a aquecesse. Vários minutos
depois, foram até o quarto, onde encontraram Harumi olhando sem piscar, para a
janela. Aproximaram-se, Jun segurava firmemente a cintura de Eloise com uma das
mãos.
A vista era impressionante,
ainda mais bonita do que quando as sakuras
floresciam ou quando o sol estava se pondo. O céu escuro em contraste com a
cidade brilhante pelas luzes de néon dava espaço para pequenos flocos de neve,
que flutuavam até o chão juntando-se em montinhos.
– Haru, agora já pode me chamar
de otousan. – Jun sorriu, abraçando-a
enquanto observava a neve cair.
~ ~
Ai meu pai!! Q lindooooooooooo *.*
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